Controlado por um Bebê

Ela fazia muito escândalo. Exagerava no barulho e nas expressões de irritação. Nada parecia interessante, e a reclamação era a norma. Aquilo começou a me incomodar.

Essa era a minha filha de 1 ano e 3 meses há algumas semanas.

A gritaria, hipersensibilidade e resistência me deixaram irritado, e a minha abordagem escolhida foi a do confronto. “Pare de gritar!” — eu dizia, apenas para a minha frustração.

Agora já não era apenas ela com a expressão fechada, mas eu também. O meu humor foi controlado pelo humor dela.

Nesse clima a minha esposa, sabiamente veio em auxílio. Explicou-me a situação, deu banho em Lúcia e a preparou para colocá-la no berço. Agora eu passei a me sentir mal com as minhas respostas.

Lúcia havia sido consultada recentemente, e a pediatra identificou que quatro novos dentes estavam nascendo simultaneamente. Talvez você não lembre de quando os seus dentes nasceram, mas se já viu isso em algum bebê, deve saber: novos dentes trazem incômodo. Algumas crianças, como foi o meu caso, adoecem, ficam febris, e um pouco mais quietas. Outras, como Lúcia, ficam agitadas com o incômodo, mais irritadas e sensíveis.

Em minha impaciência, eu deixei de me relacionar com a minha filha.

Existem dois problemas fundamentais nessa história, que são vivenciados nos mais diversos tipos de relacionamentos:

O primeiro deles é esse que acabei de mencionar: em meu narcisismo, deixei de me relacionar com a minha filha, e fiquei me relacionando comigo mesmo. Só importava para mim a minha paz, por isso eu desconsiderei as necessidades reais da minha princesa.

Deixar de considerar o outro é o caminho para destruir uma relação e realmente ficarmos sozinhos. Essa direção autorreferente nos acompanha desde a Queda, quando Adão usou Eva para se proteger, colocando a culpa nela. Só importava a ele o livramento pessoal.

Mas, contra isso, somos lembrados que nós carregamos a imagem de um Deus comunitário. Pai, Filho e Espírito Santo experimentam comunicação e amor real. Nós fomos criados para refletir essa realidade, e assim nos relacionar, amar e nos comunicar com o outro.

Há um segundo problema: eu deixei o humor de Lúcia controlar o meu. Observe a cena com algum distanciamento, e veja o quão patético é isso: eu deixei que uma criança de um ano definisse o meu humor e as minhas reações.

Nós cometemos esse erro costumeiramente: as palavras, gestos, posturas e expressões dos outros parecem nos dominar e definir as nossas próprias palavras, gestos, posturas e expressões. O mau humor de um amigo nos deixa mau humorados; o deboche da esposa nos deixa irritados; a reclamação de um chefe nos deixa irados; a crítica da mãe nos deixa desequilibrados.

Há muito o que pensar sobre isso, mas não é nosso propósito aprofundar o ponto aqui. Apenas precisamos reconhecer que isso acontece, muitas vezes, por nosso “temor de homens” — uma dependência quanto aos modos de outras pessoas lidarem conosco.

Sempre que isso acontece, nos tornamos reféns dos outros, e perdemos a liberdade de agir com clareza e boa consciência.

Não é fácil fugir — temos que reconhecer –, mas também precisamos reconhecer que a responsabilidade pelas nossas respostas é exclusivamente nossa. Os outros não nos fazem agir como agimos; nós escolhemos responder assim.

Essa consciência pode nos fazer responder melhor nos momentos difíceis. O marido está “ácido”? Você pode oferecer graça em vez de se unir a ele na acidez. A mãe fez uma crítica? Você pode decidir pensar sobre isso em vez de entrar no modo “defesa”. A bebê está irritada? Você pode acolhê-la e ajudá-la na sua confusão emocional ou na dor física.

Talvez você já esteja lembrando de episódios, como o meu, em que cometeu graves erros. Mas a história não precisa terminar assim.

Quando minha esposa entrou no quarto de Lúcia para colocá-la pra dormir, entrei lá, dei um beijinho na princesa e pedi perdão. “Perdoe o papai porque ele não foi paciente com você”.

Eu não sei o quanto disso ela assimilou, mas sei que ela deve crescer em uma casa na qual os erros são reconhecidos e confessados. Esse é o caminho bíblico da reconciliação. O reconhecimento comunica ao outro o meu desejo de acertar, e me dá consciência do problema.

Eu sei que vou errar outras vezes. Não posso esperar perfeição desse lado da eternidade. Mas eu posso crescer, um pouco de cada vez, em maturidade e graça.

E você também.